Pedro Cordas: o homem que dedica a vida à arte japonesa de atar pessoas

Foi pela primeira vez ao Japão há 22 anos e apaixonou-se pelo que é, habitualmente, conhecido como Shibari. E nunca mais parou de aperfeiçoar a sua arte. Hoje faz performances, dá aulas e é um dos nomes mais proeminentes desta área.

Foto: TabU Party

Pedro é um artista. As cordas são o seu instrumento de trabalho – de tal forma que as adotou como apelido artístico – e as pessoas que ata são a matéria-prima que usa para criar estruturas incrivelmente apelativas e visualmente impactantes. Atualmente, Pedro Cordas é um dos nomes mais proeminentes no que é, habitualmente, conhecido como Shibari, a forma de bondage desenvolvida na subcultura japonesa do BDSM, e dedica os seus dias a partilhar os seus conhecimentos e dar a conhecer esta forma de arte.

À Kinks, conta que tinha acabado de completar o seu curso na Faculdade de Belas Artes quando teve o primeiro contacto com as cordas, já lá vão 22 anos. “Estava a fazer um trabalho relacionado com o BDSM e andava um pouco à procura de fetiches, na altura muito focado nas mãos e nos pés. Isso acabou por coincidir com uma viagem que fiz ao Japão e foi aí que tive a ideia de fazer uma evolução do tema que estava a trabalhar para algo com uma pessoa atada”, explica, revelando que foi em Tóquio que sentiu o “clique” que o empurrou, definitivamente, na direção das cordas.

“A partir daí encontrei alguns materiais, entre cordas, livros e vídeos que ensinavam a atar”, lembra, explicando que, quando regressou a Lisboa começou a praticar, “com algumas pessoas amigas, num contexto não sexual”. “Acabei por perceber que não estava ir a lado nenhum sozinho”. Por isso, decidiu regressar ao Japão, onde este universo, na altura, muito fechado ao exterior e visto com maus olhos pela cultura tradicional.

“Havia muitas partes da cultura japonesa que não estavam abertas para estrangeiros. Era difícil entrar, assistir e ser aceite. Não era uma questão de dinheiro: tínhamos de ser vetados e validados. Bastava cometer um erro para uma porta se fechar”, revela à Kinks, explicando que o Shibari – ou Kinbaku, na referência mais tradicional e exata japonesa – era algo muito “underground”. Foi com a ajuda de Steve Osada, um fotógrafo e atador alemão, que na altura estava a começar a sua carreira, que conseguiu acesso a estes locais e, depois, a Akeshi Denki, uma lenda desta arte e que, ainda hoje é uma personagem inspiradora no percurso de Pedro Cordas.

“Havia muitas partes da cultura japonesa que não estavam abertas para estrangeiros. Era difícil entrar, assistir e ser aceite. Não era uma questão de dinheiro: tínhamos de ser vetados e validados. Bastava cometer um erro para uma porta se fechar.”

Ao todo, Pedro Cordas já foi ao Japão cerca de 15 vezes. Ao longo dos mais de 20 anos de experiência e devoção às cordas, revela que já passou por diferentes fases na sua carreira: “já estive muito focado só em aprender e ser tecnicamente bom na complexidade das estruturas das construções. Depois houve um outro momento, quando já dominava de uma forma mais fluida a parte técnica, em que comecei a focar-me mais na comunicação e na interação com o outro, na parte mais emocional”, partilha. “A seguir, houve um momento mais intenso, que foi passar da intimidade para a intimidade associada ao BDSM, com a complexidade dos estímulos que se causa ao outro”, explica Pedro Cordas à Kinks.

Durante esse percurso, Pedro, foi ganhando nome por cá, muito devido às suas performances em eventos fetichistas e de BDSM. “Com o passar dos anos e com a maturidade as coisas vão mudando. Hoje, já não procuro tanto a complexidade técnica, procuro mais a parte da conexão ou da comunhão com o outro, de conseguir relacionar-me com o outro de maneiras mais próximas”, revela, sublinhando que as festas fetichistas são sempre uma boa desculpa para criar e dar um espetáculo.

Foto: Agustin Tentesion Benitez Mir (Direitos Reservados)

Atualmente, divide a sua atividade entre estas performances e espetáculos em eventos públicos e sessões privadas – em Portugal e no estrangeiro, em que pode ser contratado para satisfazer a fantasia de um casal ou de várias pessoas em verem alguém ser atado. Também faz sessões fotográficas, colabora em filmes e dá aulas onde partilha o seu conhecimento das cordas, de forma privada, no seu estúdio, ou em workshops de grupo.

É na sua conta de Instagram que vai partilhando os seus trabalhos e criações. E é também por aqui que, quem queira saber mais sobre o seu trabalho e como pode aprender a dominar as técnicas do Shibari, deve entrar em contacto com Pedro Cordas.

“Dizer que isto é seguro, que não tem riscos ou que é confortável, é dourar um pouco a pílula. É adocicar o tema. Isto é uma prática de ‘edge play’, ou seja, é de alto risco. É algo novo, divertido, apelativo, artístico. Mas as pessoas têm de perceber que tem um outro lado que é perigoso. Se a pessoa se desleixa, corre mal”

Pedro reconhece que há vantagens no facto de esta arte japonesa se ter transformado em algo “mais mainstream” nos últimos anos. Mas deixa um alerta a quem acha que esta é uma prática simples e inofensiva: “não é”. “Dizer que isto é seguro, que não tem riscos ou que é confortável, é dourar um pouco a pílula. É adocicar o tema. Isto é uma prática de ‘edge play’, ou seja, é de alto risco”, avisa.

“É algo novo, divertido, apelativo, artístico. Mas as pessoas têm de perceber que tem um outro lado que é perigoso. Se a pessoa se desleixa, corre mal”, alerta à Kinks o performer, sublinhando que “ao normalizar esta prática estamos a aumentar a probabilidade de acontecerem acidentes”. “Isto nunca deixou de ser uma prática de risco, por mais mainstream que se torne”, afirma. Por estar ciente de todos estes riscos, Pedro deixa um conselho a que se sente atraído por experimentar esta arte: “procurem ter uma aula com alguém qualificado”. “Os elementos que utilizamos são simples, mas a sua simplicidade é complexa”, explica, destacando que elementos tão simples como o material das cordas – no caso do Shibari são utilizadas cordas de juta – fazem toda a diferença.

“Muitas pessoas procuram cordas nas sex shops, mas estas cordas não são adequadas para o Shibari. Normalmente são feitas de materiais que podem partir, que podem apertar demasiado e que podem até levar a queimaduras de fricção na pele”, avisa. “Isto para não falar na facilidade com que as pessoas se podem lesionar se não tiverem o devido conhecimento ou noção do que estão a fazer”, frisa, sublinhando que “o ideal é falar com quem sabe primeiro, para ter as bases e depois comprar as cordas adequadas e praticar de forma mais segura”.

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